O Ódio

segunda-feira, janeiro 11, 2010 Posted In , Edit This 0 Comments »
O pai da psicanálise, Sigmund Freud, estabeleceu que nós carregamos, por dentro d'alma, duas pulsões importantíssimas. Ele chamou de impulso de vida e impulso de morte.
O impulso de vida, que ele chamou de impulso de Eros, é aquele em que trabalhamos tudo que é bom, tudo que é para cima, tudo que é pró-vida, alegria, o trabalho, o entusiasmo, a amizade, a família. Tudo isso que faz a vida crescer, é chamado por Freud, impulso de vida.
Mas ele também chamou de impulso de morte aquelas pulsões em que nós apelamos para o desânimo, para a depressão, para o desalento, para a inimizade, para a calúnia. Tudo aquilo que faz a vida cair, tudo aquilo que faz a vida depreciada.
Dentro desse impulso de morte, que um de seus discípulos chamou de impulso tanatológico, nós encontramos o ódio.
O ódio é dessas forças terríveis que vão maculando a criatura, que vão destruindo o indivíduo e certamente infelicitando-o.
O ódio tem mil efeitos, cada um deles pior que o outro.
Quando pensamos nos efeitos do vago-simpático que o ódio provoca, a acidez, a diarréia, o desânimo; quando imaginamos a hipertensão, quando pensamos na depressão, na inapetência, todos esses elementos são provocados pelo ódio.
É uma força destrutiva por excelência, e quando começa, como uma caudal, ela não se detém. Essa força não pára se o detentor do ódio, aquele que está alimentando o ódio, não cair numa realidade expressivamente positiva de que essa força ou essa energia negativa que ele impulsiona, que ele conduz, não tiver termo.
É preciso então que pensemos que o ódio, antes de destruir a qualquer pessoa, de ser dirigido a qualquer coisa, ele primeiramente tenta e consegue desarticular o seu portador.
Portar o ódio é como carregar lixo na alma. Por isso, vale a pena pensar que essa força descontrolada, descompensada, essa força desnorteada em que o ódio se traduz, serve apenas para nos fazer morrer sempre um pouco mais.
Vale a pena pensar no que é que faz com que esse ódio apareça na nossa vida.
Afirmam os seres que guiam a Humanidade, que o ódio é o amor que enlouqueceu. Sim, o ódio é o amor que adoeceu, porque a mesma energia que nós usávamos para construir, agora utilizamos para destruir. A mesma criatura sobre quem dirigíamos o olhar de ternura, agora dirigimos um olhar furioso, um espectro furibundo que parte de nossa intimidade na direção do opositor.
Vale a pena pensar que não tem sentido, depois de dois milênios da visita de Jesus a Terra e que nos propôs amar os próprios inimigos, orar por aqueles que nos perseguem e caluniam, não há sentido alimentar a força fragmentária do ódio que só faz mal a nós.
Por momento, poderemos prejudicar a alguém, causar infelicidade a alguém, entristecer alguém, através da calúnia, da maledicência ou de qualquer outra providência nefasta.
Mas, fundamentalmente, no fundo do vaso de nossa alma, ficam as borras criadas pelo ódio.
***

* * *
O ódio em si mesmo provoca apenas sofrimento. Toda pessoa que odeia é uma pessoa que sofre.
Impossível se imaginar que alguém capaz de odiar possa ser feliz.
É claro que as pessoas interpretam, encenam e muitas vezes não sabem que os problemas que passam a viver em suas vidas, estão atrelados a essa carga de ódio que desferem contra terceiros.
É muito comum que os indivíduos tenham ódio em função de variadas circunstâncias.
São muitos os fenômenos do cotidiano que incitam o indivíduo a sentir ódio, a sentir essa expressão negativa do caráter, que é eminentemente destrutiva.
Uma das faces do ódio, já que ele tem diversificadas faces, é o desprezo.
Quando sentimos desprezo por alguém ou por alguma coisa, a alma age como se esse alguém ou se essa coisa não existissem.
Como o odiento imagina que essa criatura seja-lhe inferior, não merece o seu olhar, não merece a sua atenção, não merece que ela lhe dirija a palavra, vai cortando, vai bloqueando todas as ações de contato, todos os movimentos de acesso. E isso vai caracterizando o desprezo. Deixar de prezar alguma coisa, deixar de considerar alguma coisa.
E quando nós desprezamos alguém, em realidade, estamos muito infelizes. Porque tudo quanto gostaríamos, lá no fundo do ser, era a possibilidade de ser amigo de todo mundo, de receber o aplauso de todo mundo, de ser gostado pelas pessoas, de ter acesso fácil em todo lugar, de onde chegarmos as pessoas nos tratarem com alegria, com entusiasmo, com amizade.
Mas quando desprezamos, nos isolamos, nos fechamos, nos entrincheiramos e gradualmente vamos sentindo que as outras pessoas odiadas por nós, desprezadas por nós, continuam vivendo. E, para o indivíduo que odeia, isso é terrível.
Toda criatura que odeia gostaria que o objeto de seu ódio fosse infeliz, se tornasse infeliz. Que pudesse uma hora dele precisar, e ele poder descarregar toda a carga do seu desprezo.
Felizmente, isso não ocorre. As pessoas odiadas continuam vivendo suas vidas, porque elas só têm responsabilidades para com Deus.
Daí então, o desprezo desqualifica o odiento, atormenta-o cada vez mais e aumenta a sua infelicidade. E o odiento sofre.
Mas, uma outra faceta do ódio, tanto ou mais terrível quanto o desprezo, é o desejo de vingança. Sim, o odiento não se conforma em apenas desprezar. Deseja, em muitos momentos, fazer justiça com as próprias mãos.
Fulano me fez isso, há de pagar!
Se existe um Deus no céu, Fulano há de pagar o que me fez!
Então nós misturamos o nosso ódio com a idéia de Deus. Como se Deus estivesse ao lado de nosso desequilíbrio. Como se Deus estivesse aplaudindo nosso desregramento moral e por isto nós dizemos:
Eu não me vingo, mas Deus me vingará!
Quer dizer, se nós não nos vingamos, é porque já entendemos que isso não se faz, mas Deus, Ele que é o Autor do Universo, a Inteligência Suprema da vida, Ele se vingará em nosso nome.
Vejamos que isso não passa de uma brutal infantilidade. Nós somos ainda criaturas muito infantis em termos espirituais e imaginamos que o nosso impulso de vindita, de vingança, vai nos fazer mais felizes.
A vingança chega a termos inimagináveis. Desde a calúnia movida pela maledicência, em que nós jogamos pessoas contra outras pessoas, destilamos o veneno contra os outros, até o homicídio, até o suicídio.
Sim, Freud estabelece que todas as pessoas que se matam são capazes de matar.
Muita gente se mata na impossibilidade de matar o objeto de seu ódio. E se mata para culpar o outro, para culpar a sociedade.
Alguns têm o desplante de deixar cartas, bilhetes, incriminando terceiras criaturas, por conta do seu suicídio.
Vemos que na hora final, quando ela se desbraga e sai do corpo, mesmo assim, o impulso negativo da alma infantilizada, do espírito infeliz, ainda se mostra forte.
Desse modo, a melhor forma de evitarmos essa onda de ódio que nos avassala é o amor. O amor que começa pela compreensão, a indulgência.
Por que as pessoas erraram contra mim?
Porventura, não terei eu dado motivos independentemente do que aquele aborrecimento nos causou?
Será válido pensar nas razões que levaram alguém a falar contra mim, a falar de mim.
É importantíssimo deixar que o amor tome conta de nós, que o amor luarize nossas consciências, e como o ódio é o amor que enlouqueceu, vale a pena vacinar sempre o amor com esse remédio do trabalho, do relacionamento feliz, para que ele nunca adoeça, com esse remédio da confiança, do trabalho conjunto, da autodoação para que o amor nunca adoeça, sempre admitindo que as pessoas têm direito de se equivocar como nós.
E, por causa disso, ao invés de ódio, vale a pena o amor, até porque, segundo o Evangelista, Deus é amor.


Transcrição do Programa Vida e Valores, de número 108, apresentado por Raul Teixeira, sob coordenação da Federação Espírita do Paraná.
Programa gravado em agosto de 2007.
Exibido pela NET, Canal 20, Curitiba, no dia 22 de junho de 2008.

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